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Maria não vai com as outras.

opiniões pessoais sobre tudo um pouco.

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06
Mai19

Mulheres contra Mulheres.

Patrícia Pereira

Se há coisa que quem me conhece sabe que eu digo com frequência é a expressão - "a mulher é um bicho terrível". Não o digo no sentido pejorativo, afinal de contas eu sou uma mulher. Mas no sentido que nós, mulheres, não somos por norma boas umas para as outras. Somos as primeiras a apontar alguma coisa mal nas outras, em vez de nos apoiarmos, na medida em que ainda somos na maior parte uma segunda categoria de ser humano. Não somos um homem branco, que continua a estar no topo da nossa cadeia alimentar.

 

E ontem dei por mim a pensar nisso porque eu por norma tenho um grande amor-próprio. Sou moça de me olhar ao espelho e apreciar o meu corpo por aquilo que é. Apesar das minhas coxas largas já me terem lixado a auto estima anteriormente, dos meus ombros largos também, da minha pele branca e com sardas também. Actualmente vejo cada vez mais o meu corpo como parte da minha identidade. O que me faz semelhante à minha mãe e três irmãs. Todas nos de ombros largos e coxas largas, mas todas nós mulheres fortes, tanto de personalidade como força física. Sou filha de agricultores e aprendi a usar o meu corpo para o trabalho duro, e muito embora quando era pequena detestasse, actualmente aprecio imenso as marcas que esse trabalho deixou no meu corpo. Tenho bastante força física, bastante mais que o meu namorado ate, e não acho que isso faça menos mulher de mim, muito pelo contrário. Embora isso não corresponda ao estereótipo de mulher.

 

No entanto ontem, num almoço do dia da mãe com a família dele tive de confrontar as minhas inseguranças. Porque as mulheres da família dele são muito mais femininas. São mulheres de coxas estreitas e ombros estreitos, ate menos peito que eu. São mais as mulheres das revistas de moda, pequenas e maquiadas e vestidas com roupas femininas e saltos altos. Eu, nas minhas calças de ganga, camisa de corte masculino, mocassins e zero maquilhagem senti-me uma espécie de aberração. Senti-me observada por elas, como quem reprova as minhas escolhas e espera mais para o irmão, tio e filho delas.

 

E disse-lhe isso a ele. Em parte por vergonha, em parte porque precisava de desabafar, para não deixar que aquele pensamento que lixasse o dia. Se bem que invariavelmente tornou-se o pensamento que dominou o meu dia. Não que as mulheres da família dele tenham feito alguma observação, em parte já se habituaram a minha diferença. Mas olharam da forma que olharam, porque nós mulheres somos formatadas dessa forma. Para nos criticar a nós, para nos criticar-mos umas as outras. Para nós sentir-mos perpetuamente miseráveis. Assim aderimos as modas, de forma a mudar quem somos. Compramos todos os produtos que nós vendem para sermos quem não somos.

 

Hoje acordei mais lucida. Voltei a olhar-me ao espelho e apreciar o meu corpo. Mentalizei-me que não faz bem nenhum continuar com esse ciclo vicioso. E que em vez disso devia amar as minhas coxas largas, os meus ombros largos e fortes, os meus braços e pernas musculadas. Porque é o corpo da minha mãe. É o corpo das minhas três irmãs. Não é um corpo de revista de moda. É um corpo real. Foi moldado por gerações da minha família, de mulheres que trabalharam no campo e que viveram naquele clima frio do norte. Todas pálidas de pele, todas fortes de ombros e coxas largas. E isso é a minha identidade. É a identidade da minha família.  É a identidade das minhas tias e primas. É a identidade das minhas avós. E das mulheres da minha família que nunca conheci. E isso é mais importante que me comprar a outras mulheres com corpos diferentes que foram moldados por situações diferentes de vida.  

 

A elação mais importante que tirei disto foi amar-me. Cuidar de mim, da minha saúde física e mental. É a minha religião actualmente. Custou a chegar a onde cheguei, já tive um ódio enorme a pele que hábito, mas isso foi noutro tempo. Essa pessoa já não existe, felizmente. E por isso posso dar-me ao luxo de ter um momento de fraqueza. Afinal de contas tenho pessoas que me amam e é tudo o que importa nesta vida. E é por isso minha obrigação amar-me a mim.

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